18/05/2011

A GRAMÁTICA E OS ENSINAMENTOS DE JESUS

Este texto é uma parábola. Conhecer a língua portuguesa pode contribuir muito para a nossa caminhada de retorno ao Pai, porquanto nos permite interpretar melhor os ensinamentos de Jesus. Vejamos a passagem seguinte:



E vós, quem dizeis que eu sou? E Simão Pedro, respondendo, disse: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque to não revelou a carne e o sangue, mas meu Pai, que está nos céus. Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja...


Esse “porque to não revelou a carne e o sangue” encontra-se fora de nossos padrões coloquiais. Para formar um entendimento melhor, temos que, por exemplo, desmembrar o to em te e o. Assim ficará: “porque te não revelou isso a carne e o sangue”. Esse raciocínio está correto, conforme se observa nas traduções seguintes: [...] porque não foi um ser humano que lhe revelou isso...
[...] porque não foi a carne nem o sangue quem te revelou isto...
[...] porque não foi carne e sangue quem te revelou isso...
[...] porque não foi carne ou sangue que te revelaram isso...


Examinando as frases acima, observamos, entretanto, que nova dúvida surgiu: isto ou isso? “Isto” ou “isso” têm o mesmo significado? Aqui, salvou-me um velho professor:


Os demonstrativos este e esse têm também a seguinte propriedade de indicação: este apresenta coisa que se pretende mostrar, coisa desconhecida ou coisa que se tem na frente de que fala ou mais perto do que outras já citadas ou tratadas; esse indica coisa já apresentada, conhecida: “Prestem atenção nisto” (que vou dizer) – “Não foi isso que mandei comprar”. (grifo nosso)


Conforme se observa, parece que melhor teria sido o uso do pronome isso. Entretanto, o professor Napoleão ressalta que:


Outras vezes, em lugar de esse emprega-se este, para referir-se, em confronto com outras, a coisa mais presente, mais do momento, mais à mão, embora já apresentada, já conhecida. [...] “Este assunto não me agradou”. (grifo nosso)


Todas as dúvidas ainda não se dissiparam. Como se explicam as diferenças entre “revelou” e “revelaram” seguintes?


“porque to não revelou a carne e o sangue’;
“porque não foi carne e sangue quem te revelou isso”;
“porque não foi carne ou sangue que te revelaram isso”.


No primeiro caso, o sujeito é composto, mas o verbo está no singular porque ele se encontra posposto e, assim, a concordância pode ocorrer com o mais próximo. É o caso célebre do “passará o céu e a terra”.


No segundo exemplo, o quem deve ser desmembrado em “aquele que”. A última frase, portanto, ficaria sendo “que te revelou isso”. Como o “que” está se referindo a “aquele”, o verbo fica no singular.


No último caso, o “revelaram” está correto, pois o “que” está se referindo ao sujeito composto “carne ou sangue”. Neste caso, como no anterior, podemos entender também que o “foi” e o “que” são expletivos, ou seja, podem ser retirados da frase sem alterar a essência de seu significado. A frase ficaria: “porque carne e sangue não te revelaram isso”. O verbo no plural, contudo, traz uma nova dificuldade para o entendimento da mensagem. Há casos em que, mesmo se tratando de sujeitos compostos, o verbo fica no singular quando existe a idéia de totalidade. Nos exemplos anteriores, podemos entender que “carne” e “sangue” trazem a idéia de totalidade, conforme, aliás, está na tradução seguinte: “porque não foi um ser humano que lhe revelou isso”.


Se alguém está achando isso complicado, não conhece a polêmica que existe sobre a sentença seguinte: Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta [essa] pedra edificarei a minha igreja. Aqui, para alguns, a interpretação dada a “esta” ou “essa” pode abalar os alicerces de uma instituição milenar. É um tema desafiador, mas, preliminarmente, permito-me recordar apenas o contido em Hebreus 5,11-12:


Temos muito a dizer sobre este assunto, mas é difícil explicar, porque vocês se tornaram lentos para compreender. Depois de tanto tempo, vocês já deviam ser mestres; no entanto, ainda estão precisando de alguém que lhes ensine as coisas mais elementares das palavras de Deus.


Repetindo: Este texto é uma parábola; “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.”
(04/2008)