05/11/2010

FILHOS E BEBIDAS ALCOÓLICAS

Tenho uma boa notícia, mas antes, a fim de torná-la melhor ainda, façamos uma introdução. Meu filho tem 14 anos; completa 15 em julho próximo.
Ele foi a uma festa neste final de semana. Eu e minha esposa ficamos preocupados, pois sabemos que vários jovens de sua idade já estão consumindo bebidas alcoólicas. E eu, que fui alcoólatra por vários anos, conheço bem as conseqüências lamentáveis do consumo excessivo de bebidas.

Usei o termo “alcoólatra” não apenas para efeito de retórica, mas porque ele verdadeiramente expressava a realidade que eu vivia. No meu entender, quem aguarda o final de semana ou marca data e hora para beber é alcoólatra. Não é alcoólatra aquele que bebe ocasionalmente em festas e comemorações, diferentemente daquele que, como eu nos velhos tempos, realizava festas e comemorações para beber.

Se alguém ler este texto, provavelmente irá contestar. “O Anacleto está sendo radical, quem toma uma cervejinha pra relaxar não é alcoólatra”. Como digo para os residentes da El-Shaday: o problema não está numa “latinha” ou numa “grade”, no dia ou no final de semana – está dentro de você. Está em responder, sinceramente, como a “latinha” está agindo em sua vida. Algo semelhante ao que Jesus disse sobre o adultério: “[...] todo aquele que olha para uma mulher e deseja possuí-la, já cometeu adultério com ela no coração”.

A propósito, a relação entre pai, filho e bebidas alcoólicas me lembra a historinha de Mahatma Gandi. Uma mãe procurou Gandi para ele dissesse ao filho dela que comer açúcar era prejudicial à saúde. Gandi pediu à senhora que voltasse na semana seguinte. Na semana seguinte, Gandi disse ao garoto que comer açúcar era prejudicial. “Por que, Mestre, o Senhor não disse isso para o meu filho na semana passada”, perguntou a mãe. Gandi respondeu: “Porque até a semana passada, eu comia açúcar”.

Chega. Vamos à boa notícia. Parte do texto seguinte é uma transcrição parcial e adaptada da reportagem “Rebeldes com causa” publicada na Revista O Globo de 03.05.09.

[...] A tribo dos straigh-edges vai se proliferando pela cidade, com a filosofia de se divertir sempre, mas alienar-se jamais. São jovens que se cansaram dos excessos e assumiram uma postura mais sóbria, mas não menos radical. Eles têm no máximo 30 anos, muitos são vegetarianos, acham que sexo deve ser feito por amor, apóiam causas ecologicamente corretas (como ser contra rodeios e qualquer outra crueldade com animais), não bebem, não fumam, não usam drogas – se não se divertem menos por isso. Eles usam o tempo juntos para pôr em prática o que pregam. Tradicionalmente, a opção pela abstinência alcoólica está marcada no corpo de uma um: a letra X riscada na mão significa que o straight-edge optou por esse estilo de vida. Eles alegam que o consumo de bebida e as drogas anestesiam os indivíduos e que é preciso estar sóbrio para mudar a sociedade.

Deixem-me fazer um aparte. Esse foi o principal motivo de eu ter parado de tomar meus “fogaréus”; não para mudar a sociedade, mas para mudar a mim mesmo, pois, se eu acredito nas palavras de Jesus – não em tudo que está escrito no Novo Testamento –, não fazia sentido perder mais tempo, pois Ele disse: “Se não nos transformarmos NUNCA entraremos no Reino do Céu”. E ninguém se transforma anestesiado pela bebida, pelo trabalho, pela religião ou pelo falatório das conversas. A pessoa somente se transforma quando está acordada e consciente de si mesmo.

Continuando com o texto. Os straigh-edges são pessoas antenadas com o que há de mais novo no planeta. São jovens com atitudes nada egoístas. A única forma de violência deles é a sonora. O som é rasgado, gritado, com letras contra o sistema – seja lá qual for. Atitudes agressivas somente no palco.

Estou torcendo para que a filosofia de vida dos straigh-edges – se realmente ela é o que a reportagem está dando a entender – seja assimilada e aperfeiçoada por outros jovens, divulgada pela mídia e estudada por nossas universidades. Entretanto, o mundo está tão confuso que não posso deixar de me perguntar: “Será que estamos preparados para aceitar nossos filhos como straigh-edges?” Visualize a festa de aniversário de seu filho cheia de straigh-edges. Como você se sentiria no meio deles, sendo o único com sua latinha de cerveja na mão?

Pensando bem, talvez esse negócio de meu filho se tornar um straigh-edge – isto é, ser vegetariano, não beber, não fumar, não drogar, querer mudar a sociedade, etc. – seja coisa de maluco, e isso pode acabar complicando minhas cervejinhas. Complicando até minha própria vida, pois não tenho freqüentado à igreja ultimamente, e a mãe dele – como aquela mulher da novela das seis – acredita cegamente que Deus castiga.
(05/2009)